Precisamente às dez horas, dezenove minutos e cincoenta e sete segundos do dia onze de setembro de 1992 uma senhora, na rua Primo Piccoli, em Americana, cortava com os dentes falsos um pedaço de linha alaranjada que usara para bordar um nome num babador.
Há cerca de dez quilômetros dali, no Hospital Municipal, uma garota nascia roxinha. Seu pai, um produtor de TV local, registrava o momento em que a pequerrucha chegava à unidade neonatal. A tia, irmã de seu pai, exclamava: "ela está toda roxinha!". O pai pegou a fita, montou em sua motovespa e, quarenta minutos depois de nascer, Isabelle aparecia na TV. O locutor declarava: "Nasceu a filha do Biajoni - e, por Deus, ela não tem o nariz do pai!". É, por Deus!
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O casamento durou pouco mais de um ano e os pais gostavam quando Isabelle fazia bico, imitando "bichinho". Imita bichinho, filha. E ela imitava. Func func. O pai ficou em Americana e a mãe retornou com ela para Volta Redonda, Rio de Janeiro - cidade dos avós maternos. A família grande abriu os braços para a mascote que já veio fazendo "bichinho". A avó: tá na hora de comer angu. Virou uma anguzeira a Isabelle. Descendente de italianos, acabou Isabelle Polenta. Continuou fazendo func func.
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O pai ia visitá-la quando dava, dentro de um ônibus por oito horas, o que lhe tirava as energias. Nos encontros, Isabelle começou a mostrar os dotes artísticos: plantava bananeira, flutuava, fazia enormes bolas de chiclete e lhe mostrava os amigos imaginários de cores que ainda não existiam, mas que, agora, com os modernos recursos da computação, talvez existam. Agora, também, não importa. Existem amigos de cores reais.
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Um dia (sempre acontece um dia) a mãe decide ir para os EUA e a filha vai junto. Mas lá não encontram angu e ela decide voltar. Tem também o detalhe do frio e, embora não seja nariguda, Isabelle Polenta tem um nariz entupido demais. O pai acha que é porque ela come muito trigo, açúcar e chocolate. A mãe diz que é emocional - talvez para incutir alguma culpa ao pai. Sabe como é ex-marido e ex-mulher...
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Na volta ao Brasil, a polenteira vai para o colégio onde coleciona boas notas apesar do narizinho tapado que a impede de dormir a contento. A mãe lá, ela aqui, a saudade em todo lugar. E os estudos, e as aulas de violão, inglês e jazz (que na verdade é lambaeróbica) - canseira, né? Então.
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Um dia (outro) decide ir visitar a mãe. Programa para vê-la no dia do próprio aniversário. Vai com a avó para os EUA uns dias antes e, no dia do aniversário, bum!, caem as torres gêmeas! Bin Laden fica famoso. A volta ao Brasil fica complicada. Isabelle fica com dúvidas. Enquanto todos os imigrantes fogem do país com medo de novos atentados, a pequena polenteira decide ficar. Decide voltar a morar com a mãe. Decide retomar os estudos por lá e, se possível, tornar-se cidadã americana. Volta ao Brasil para terminar a quarta série e está com as malas prontas para, já, dia 11 de agosto próximo, retornar à Grande Nação. No próximo dia 11 de setembro estará no colo da mãe. Vai levar o babador que a bisavó Maria bordou em 1992. Está lá: Isabelle - escrito em laranja.
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Nossa! que saudade que eu estava deste texto!
não tinha ele em lugar nenhum e todo mundo sempre perguntava o porque do nome do blog...aí esta a resposta
Ele é meio velinho (2002-08-03 - 18:07:36). Vou falar para o meu pai para
quando eu for lá para americana (dia 15)para nós fazermos uma continuaçaodele,
vai ficar legal!
;**
3 comentários:
linda.
...
esse é um dos textos mais legais, vai dizer?
:>)
This is very interesting site... »
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